Mensagem da Marta, no telemóvel:
«Avô, compras-me uma vassoura? »
Vamos lá tirar isto a limpo:
- Está, Marta?....
O que eu calculava. Vassoura de bruxa, quer mascarar-se na
festa da Escola, amanhã sexta-feira. Vão desfilar pelas ruas de Sintra, antes
da pausa do Carnaval. A mãe já lhe comprou a fantasia, só falta a vassoura.
E que posso eu fazer hoje, neste dia a que a bisa Maria chamava quinta-feira de compadres?
Também havia uma quinta-feira das comadres, ou seja, a
penúltima antes de Terça-feira Gorda.
-Não, Marta não vou maçar-te
com mais histórias da bisa. Quando um dia quiseres saber delas, já não
terás modo de mas ouvir. Vamos à vassoura…
Então não lembro, menina, quando lengalengava contigo, para
que comesses mais um colher de sopa: Puxa,
puxa, a vassoura da bruxa!
Uma vassoura à medida
dos teus desejos, e dos meus, se possível .
***
Comecei pela loja dos chineses. Plásticos e mais plástico! De
palha, já não se fabrica. Quantos
milhares de chineses vassoureiros terão,
entrementes, perecido sem deixar notícias da sua arte? Fez-se-me luz: e
esteiras, têm esteiras? Desfeitas , forneceriam junco para a vassoura. Seria
apenas uma questão de trabalho. Todavia:
- Só esteilas
plástico!
Não cedo. Ainda me resta a hipótese da drogaria, a
última cá do bairro.
Já me custa subir esta calçada da Rinchoa, Marta.
Ainda ontem por aqui andei a saltitar com a tua mãe e tios. Dava-me jeito ter
agora à mão aquele meio cajado de madeira que, há uns tempos, eu destinava a
futura bengala. Está lá em casa, atrás da
porta. E agora acabou-se: será cabo da tua vassoura. Tem altura e espessura
ideal para o efeito.
Continua a faltar o principal, Marta. Aqui na
drogaria, loja de ferragens, tintas e muitos desnecessários etcs, há tudo, menos a vassoura ideal ou
material para a sua feitoria. Não, não vou comprar-te aquele vassourão de
piaçaba. Além de não poderes com ele, há de destoar com o teu vestido, vestido
que ainda não vi, entenda-se.
Não se perca mais tempo. O que nos reserva a solução
artesanal? Há um cabo, herdei o saber-fazer mas falta a palha. Que tristeza,
nem um maço de ráfia se vende na drogaria dos etcs.
E a ráfia? Cujo último fornecimento fora adquirido,
dias antes, por um cliente para enxertias, carregou-me no interruptor.
À falta de barbascos, ineixas ou giestas, com que se
varriam pátios quintais e eiras, temos substituintes no quintal da vizinha Ana.
«Já está. Gostas,
Marta?» Foto em anexo.
Respondeu-me no fim das aulas:
- Iá, avô, tá o máximo. Que folhas são aquelas,
pergunta a mãe.
Ramitos de cana da India misturados com folhas de
iúca.
Tudo muito bem amarrado ao cabo, como fazia o bisa
António. Com várias voltas de arame de zinco.
- A corda que se vê por fora é só para enfeitar,
Marta…
- Beijinho, avô!
Ah se eu pudesse repartir esse beijito com quem me
ensinou a fazer vassouras, quando eu tinha oito anos como tu.